Depois de muitos dias, cá me decidi a deixar um testemunho do que foi a minha Maratona do Porto.

Os momentos vividos antes da maratona foram muito agradáveis. A expo maratona estava muito bem organizada e apelativa, com vários e interessantes stands. Fiz questão de ir à pasta party com o óbvio objectivo de encontrar alguns amigos e conviver um pouco com eles. Há tanta gente que encontramos nas provas mas com quem não conseguimos mais do que trocar as habituais palavras de cumprimentos. A expo maratona, com as condições que o Palácio de Cristal permite, é um excelente momento para isso! Encontrei o
Andrade, o
Adelino, o
Mota, o
Veloso, o
António, o
Vitor entre muitos outros. Gostei bastante desta parte da maratona.
No dia da prova tinha, este ano, um apoio adicional. O meu amigo João Fernandes, por não estar em condições de correr a maratona, decidiu acompanhá-la de bicileta, propondo-se a seguir-me durante grande parte do tempo. Foi um apoio excelente.

Como habitualmente acontece, deixei tudo preparado de véspera para que no dia da grande prova não houvesse o menor stress. Tudo correu conforme previsto e estava no Porto a tempo e horas. Antes da prova procurei por alguns amigos, mas a chuva que estava a cair fez com que as pessoas se concentrassem em locais abrigados, pelo que poucos consegui saudar. Procurava especialmente o
Ricardo, que vindo dos Açores e correndo para objectivos idênticos aos meus, seria, certamente, uma excelente companhia. Infelizmente, só o viria a encontrar na passagem pela meia maratona, na Afurada, vinha ele um pouco atrás de mim.
No momento da partida, não consigo explicar bem porquê, tive um momento de alguma emoção que me surpreendeu. Foi depois do vídeo que foi projectado e a poucos minutos de começarmos. Não sei o que me aconteceu, mas será certamente por momentos daqueles que as maratonas são únicas nas nossas vidas. Sá mágicas. São diferentes de tudo o resto. Fazem-nos diferentes. Fazendo-nos sentir coisas novas.

Ao tiro de partida, lá avanço eu. Parti junto dos atletas do Rompe Solas, um simpático clube da minha terra, no qual tenho bons amigos. No início avançamos juntos. Já na rotunda da Boavista apanhamos o Francisco Lobo do PortoRunners, médico que trabalha comigo e de quem me tornei amigo a propósito desta coisa das coridas. Estava aí formado o meu primeiro grupo de corrida: eu, o João do Rompe Solas e o Francisco Lobo. Andamos sempre juntos (havia mais alguns que iam e vinham) até à meia maratona. Apesar das minhas (boas) intenções de correr a ritmos superiores a 4:45/km (o ideal seria andar a 4:50/km), a verdade é que não soube ser disciplinado. Algum excesso de confiança, o perfil traiçoeiro dos primeiros 10 km e o espírito "maria-vai-com-as-outras" fez com que me fosse deixando andar a ritmos que eu sabia serem demasiado elevados. A passagem aos 10 km aconteceu com cerca de 46 minutos!

Apesar da consciência de que estava a andar demasiado rápido, não fiz nada para contrariar isso. Aliás, durante esta fase ouvia alguns atletas que corriam ao nosso lado falar dos seus objectivos, havendo vários a referir que pretendiam terminar na casa das 3h15m. Apesar de saber que não era esse o meu campeonato, fui-me deixando levar. Que estúpido que fui!

Na passagem à meia maratona o relógio marcava 1h38m. Nessa altura o Francisco Lobo adiantou-se ligeiramente a nós e continuei com o João. Deixamo-nos ficar. O ritmo, nessa altura, já estava a baixar ligeiramente. Rolavamos acima dos 4:45/km e, apesar de ainda não haver dificuldades, eu pressentia que o "filme" do ano anterior poderia estar a preparar-se para ser repetido.
Depois de passar a ponte D. Luis e na ida ao Freixo fiquei com essa certeza. Foi nessa fase que fiz o meu primeiro quilómetro acima dos 5:00 e interiormente fiquei com a certeza de que iria passar muitas dificuldades. Apesar disso, lá continuei, com o João sempre ao meu lado, a rolar num ritrmo constante e quase sempre abaixo dos 5:00/km.

Nessa altura chegamos mesmo a apanhar novamente o Francisco Lobo, o que nos deu alguma moral. Fomos assim até passar o túnel da Ribeira. Foi depois disso que comecei, verdadeiramente, a sentir dificuldades. O ritmo voltou a cair mais um pouco. Os quilómetros já eram todos feitos acima de 5:00, embora ainda sem ultrapassar muito essa velocidade. É já perto da Alfândega que o
Ricardo passa por com uma passada excelente. Fiquei contente por ele, e a desejar ter aquela frescura.

Embora com custo, ainda consegui rolar razoavelmente até ao 35km. Depois foi o descalabro. As pernas estavam cada vez mais pesadas e o meu ritmo caia a cada passada. Com grande sentido de solidariedade, o João não me largava e incentivava-me constantemente. Dizia-me que iamos bem aquele ritmo e que o iriamos conseguir aguentar desde que não aumentassemos a passada. Eu não dizia nada, mas pensava para mim próprio que, mesmo que quisesse, não conseguia manter, quanto mais aumentar! O João foi assim durante bastante tempo, mas a certa altura reduzi tanto ao ritmo que ele lá se foi. Fiquei sozinho, apenas com a companhia do João Fernandes que, de bicicleta, sofria tanto como eu.

Apesar dos incentivos constantes e de ele não dizer nada sobre o que via no meu rosto, percebi que ele estava "angustiado" de me ver "caír" daquela forma. Nessa altura sentia um peso cada vez maior nas minhas pernas. As sensações eram as mesmas porque que tinha passado há um ano, só que em dose agravada e numa fase mais precoce da prova. Os quilómetros eram cada vez mais lentos. Depois de cair para 6:00/km passei para 7:00/km, para 8:00/km, para 9:00/Km até que em plena Avenida do Brasil parei. Tinha acabado de passar pela minha mulher e pelos meus filhos, que me tinham ido ver (que triste que eu fiquei por me ter "apresentado" naquele miserável estado) e caminhei por instantes.

Fiz as minhas contas e, como ainda estava com um tempo razoável, decidi que iria tentar descansar um pouco para depois retomar a corrida o melhor que pudesse. O objectivo era apenas o de chegar ao fim, fosse de que forma fosse, fosse no tempo que fosse.

Ao meu lado o João Fernandes incentivava-me mas eu, por mais que tentasse, não conseguia reagir. As pernas estavam em estado cada vez pior. Pela primeira vez desde que corro, senti caimbras. Tentei alongar um pouco e retomar a corrida. Fi-lo durante mais uns metros, mas tive de parar novamente. Sentia-me cada vez pior. As dores nas pernas eram cada vez mais intensas e comecei a sentir um mal estar que se alastrava a todo o corpo. Passei o cartaz dos 39 Km e pensava que só faltavam 3! Mas o meu corpo dizia que ainda faltavam mais 3! Eu pensava que a maratona também era uma prova de sofrimento e tentava seguir. O meu corpo não ajudava nada. Estava neste confronto quando vejo a ambulância da Cruz Vermelha na Rotunda do Castelo do Queijo. Olhei para eles e tentei passá-los. Se o fizesse, teria de chegar ao fim. Tinha de resistir à "tentação" de me dirigir à ambulância, pensava.

Estava nesta luta interior quando nova caimbra me ataca. Olhei para o relógio e tinham passado 3h26m desde que tinha começado. Estava a menos de 3 km da meta, mas sentia que não ia conseguir. Com grande tristeza, tive que admitir a minha incapacidade. Parei o relógio e dirigi-me aos voluntários da Cruz Vermelha a pedir ajuda. Custou-me muito, mas pareceu-me que era a decisão mais sensata.
Sem meios para me socorrer, transportaram-me, alguns minutos depois, para a tenda de campanha que estava instalada junto à meta, onde me administraram um injectável que ajudou à minha recuperação. Essa curta viagem foi tremendamente dolorosa. As dores nos musculos das pernas eram terríveis. Tal como me tinha acontecido no ano anterior (embora nessa altura tenha sido depois de cortar a linha de meta), passei muito mal durante estes momentos.
Como disse no post anterior, foi mau. Foi um dia mau. Fiquei triste, mas não vou desanimar e, muito menos desistir. Vou procurar recuperar o mais rapidamente (nos últimos dias apareceu-me uma tendinite) e começar a treinar para uma nova maratona. Ainda não sei qual será nem quando será, mas vou tentar que seja no primeiro semestre de 2011.
Vou mudar algumas coisas e tentar treinar melhor. Só quando me sentir em condições de fazer a maratona, sabendo que conseguirei acabar bem é que escolherei a prova. Sei que vou conseguir.
Antes de terminar, quero agradecer ao João Fernandes a companhia que me fez nesta aventura. Quero também agradecer ao João (do Rompe Solas) a excelente companhia e a solidariedade que teve comigo nos meus piores momentos. Muito obrigado. Quero ainda agradecer a todos os que me telefonaram e se solidarizaram comigo neste momento.
Muito, muito obrigado a todos!