Wednesday 11 November 2009

A minha Maratona do Porto - A prova

Tal como escrevi nos últimos posts antes da prova, sabia-me em boa forma para atacar os 42 quilómetros. Apesar de ter feito uma preparação menos inensiva do que no ano anterior (ou talvez por isso mesmo), senti claramente o crescendo de forma e a melhoria do rendimento nas últimas semanas. Na verdade, se nos primeiros meses da preparação dei comigo, em muitos treinos, a sentir a corrida sair-me "pesada", no último mês, e muito especialmente depois da Meia Maratona de Ovar, as coisas mudaram completamente e senti-me a correr com uma naturalidade da qual, tenho de confessar, já sentia saudades.

Por outro lado, esta maratona, por já não ser a primeira, foi vivida com muito menos ansiedade. Sem perder nunca o respeito pela distância, consegui viver os últimos dias com bastante naturalidade e não me condicionar em praticamente nada pelo facto de ir correr uma maratona no dia 8 de Novembro. Talvez por isso mesmo, não estudei a prova com o mesmo cuidado com que o fiz no ano transacto, seja em termos de andamentos a impor, política de abastecimentos, etc. Deixei que essa parte acabasse por ser definida em cima do momento e um pouco em função das circunstâncias da própria prova. Vistas as coisas a esta distância, creio que o meu instinto funcionou bem no que respeita à gestão dos ritmos, mas falhou na parte respeitante aos abastecimentos, o que terá estado na origem do elevado preço que paguei no final.

Feito este intróito, que explica o meu estado de espírito tranquilo e relaxado à partida, vamos à prova propriamente dita. Entrei para a zona de partida já quando faltavam menos de cinco minutos para a largada, momento em que liguei o meu relógio (Garmin Forerunner 305). A primeira preocupação que tive foi precisamente com o relógio, pois, ao contrário do que é normal, este demorou uns bons 3 ou 4 minutos para encontrar o satélite, o que me fez chegar a temer iniciar a prova sem ter o GPS a funcionar. Imagino que a concentração de pedidos de acesso ao satélite naquele local tenha causado este atraso... Felizmente o GPS conseguiu ser activado poucos instantes antes da partida. Rodeado de amigos da blogosfera, ouvi o tiro e comecei a correr.

A corrida começa com a mais ingreme subida de todo o percurso, na Rua Júlio Dinis, um pequeno trecho que se faz bem, pois as forças ainda estão no máximo. Ao fim do primeiro quilómetro, em plena Rotunda da Boavista, controlo 4:57 e encontro o meu companheiro de 3/4 do percurso: o João Meixedo. Tínhamos objectivos idênticos e lá nos juntamos em amena cavaqueira. O objectivo era rolar a uma média por volta dos 4:45/km com o objectivo de não nos desgastarmos em demasia na primeira parte da prova.

Rapidamente percebemos que não ia ser fácil cumprir esse objectivo, pelo menos enquanto estivessemos a descer a Avenida da Boavista. Os quilómetros sucediam-se e os ritmos que variavam entre os 4:30 e os 4:40. Foi assim que completamos os primeiros 5 Km em 23:17, um ritmo bem agradável. Apesar de preocupados com as consequências futuras que esses ritmos nos poderiam causar, lá continuamos, tal era a facilidade com que a prova estava a decorrer. Com a chegada ao Castelo do Queijo e a corrida a instalar-se em piso plano e não inclinado, os ritmos baixaram naturalmente para aquilo que tinhamos previsto. Entre o 7º e o 10º quilómetro andamos sempre entre os 4:44 e os 4:54, para passar aos 10 Km em 47:04.

A partir daí, e já sem a malta da Family Race a confundir-nos os andamentos, seguimos, sempre a conversar sobre tudo e mais alguma coisa, a ritmos confortáveis que variavam entre os 4:40 e os 4:50. A certa altura, e já com mais de uma hora de prova até nos sentimos desconfiados com a facilidade com que tudo estava a acontecer. O tempo passava sem que dessemos por ele e a prova estava a ser muito fácil! Claro que dissemos isto em voz baixa, mas esse era o sentimento dessa fase. Os 15 Km foram atingidos com 1.11:07.

A légua seguinte incluia a passagem pelo túnel da Ribeira e o atravessamento da Ponte D. Luis, um momento particularmente agradável pela presença de público e, este ano, pela música da uma das bandas espalhadas pelo percurso. Curiosamente o público que nos apoiava era constituído na sua maioria por familiares de maratonistas espanhóis que, apesar disso, não regateavam apoio a todos, dando assim uma bela lição de desportivismo. O nosso ritmo mantinha-se, embora agora já com alguns quilómetros a serem corridos por volta dos 4:55. Já na zona da Afurada atingimos os 20Km com 1.35:15 e os 21Km com 1.40:15, o que apontará para a passagem à Meia Maratona com um tempo na ordem dos 1.40:45. Para os nossos objectivos era uma excelente passagem, pois dava uma boa margem para chegar à meta abaixo das 3h30m, um objectivo comum que cada um tentaria superar com a maior margem possível.

O regresso da Afurada fez-se em ritmos que oscilaram entre os 4:47 (25º Km) e os 5:02 (21º Km) numa fase em que nos mantínhamos confiantes e a correr com facilidade. Com isto alcançamos os 25 km de prova com 1.59:49. Ao longo de todo este tempo, o João Meixedo tinha já aproveitado as várias ofertas de bebidas isotónicas e de fruta que a organização disponibilizada aos atletas. Eu, com medo de reacções adversas, apenas ia bebendo alguma água e mesmo assim muito pouco. Este meu receio tinha duas razões de ser bem fortes. Por um lado, o medo de uma perturbação intestinal como a que me aconteceu no ano passado em que tive de parar para satisfazer uma necessidade em pleno jardim público. Nessa altura atribui isso ao facto de ter feito três tomas de gel ao longo da prova. Por outro lado, também não me esqueci do que me aconteceu no final da Meia Maratona Sport Zone, em que tive de parar para vomitar a escassos metros da meta, o que atribuo ao facto de ter bebido demasiada água na parte final da prova. Ora, com medo da repetição de ambas as situações, e porque não treinei devidamente os abastecimentos, acabei por beber pouca água e apenas fazer uma toma de gel aos 30 Km.

O percurso mais desagradável de toda a prova é aquele que nos leva desde a Ponte D. Luis ao Freixo. Não só pela menor exuberância da paisagem, mas principalmente pelo facto de nos afastarmos da meta numa fase em que o que mais queremos é começar a ver o fim da prova. Apesar disso, lá seguimos na mesma toada, sempre com ritmos que oscilaram entre os 4:49 e os 5:05 (26º Km). Nesta fase da corrida a conversa é muito menos frequente. O cansaço começa a aparecer e a disponibilidade para falar é menor. De qualquer forma, o moral ainda era bastante elevado. Os 30 Km foram alcançados com 2.24:20 e já estavamos virados para a meta, pensamento que nos deixa sempre mais animados.

A partir daqui e até ao final, só consegui fazer um quilómetro abaixo de 5:00 - o Km 33 - rodando sempre acima desse ritmo. Entre o 31º e o 34º o ritmo esteve abaixo de 5:10, mas o quilómetro 35 já foi corrido em 5:19. Foi nesta fase que perdi a companhia do João Meixedo que, percebendo que eu estava a entrar em dificuldades e sentindo-se forte, avançou com a sua própria prova. Estavamos por volta do Km 32. Nesse preciso momento percebi que um outro atleta que nos seguia se deixou ficar junto a mim e acabaria por ser a minha companhia permanente quase até ao final. Não sei o nome dele nem sequer trocamos nenhuma palavra. Por várias vezes que nos olhamos e creio que sentiamos bastante a companhia um do outro, tal a comunhão de corrida que se instalou entre nós. Os 35 Km foram alcançados com 2.49:50. Nessa fase, para além de sentir as pernas pesadas, sentia o peso e algum incómodo por ter as sapatilhas molhadas.

Juntamente com o meu novo parceiro seguimos sempre a um ritmo estável que oscilou entre os 5:17 e os 5:28 entre os 36 e os 39 quilómetros. Ao chegar aí fase sinto nova quebra e já nem a esse ritmo consigo seguir. O Castelo do Queijo estava perto e a certeza de que a prova iria acabar dentro de instantes era evidente, mas não dava mesmo. Foi aí que ele que perdi a minha segunda companhia da prova com grande pena. Eu bem gostava de conseguir segui-lo, mas não tinha condições para tal. O 40º km que atingi com 3.16:57 de corrida foi percorrido em 5:34. Nesta altura sabia que o GPS andava desfazado com as placas da organização em cerca de 400 metros, pelo que já dificilmente terminaria abaixo de 3h30m. A diferença não seria muita, mas já não seria possível.

Depois de virar em Matosinhos, e sempre com grande sacrifício dirijo-me à Avenida da Boavista para fazer a subida até ao local onde está instalada a fonte da glória dos maratonistas. O ritmo era o possível. O 41º Km foi feito em 5:46 e os 42º foi em 6:05! Apesar das dificuldades por que passava tinha a noção de dever cumprido, pois estava prestes a completar a segunda maratona da minha vida e iria melhorar o meu record pessoal na distância. Dobro a curva que dá acesso à meta e vejo o relógio da organização na casa das 3h32m. Seria esse o meu tempo final.


Finalizo com um agradecimento especial ao João Meixedo pela excelente companhia durante 3/4 da prova. Tive muita pena de não o ter conseguido acompanhar, mas ficará para uma outra ocasião. Agradeço também a todos os amigos que antes, durante e depois da prova me apoiaram e incentivaram para ter conseguido alcançar este objectivo.


Números finais do Garmin:
Tempo: 3h32m28s
Distância: 42,60 Km
Ritmo médio: 4:59/Km
Calorias: 3.587
Pulsação média: 145 bpm

6 comments:

joaquim adelino said...

Excelente amigo, a Maratona é isto mesmo, uma caixinha de surpresas, se bem que as quebras verificadas entre os 37 e 39 kms foram sentidas por todos, o piso e as subidas e também a distância já percorrida são a origem dos problemas musculares surgidos. Mas todos conseguiram sair de lá com maior ou menor dificuldade e concluíram dentro dos planos traçados.
É de louvar o sacrifício que o meu amigo fez (não esqueço os problemas que teve de enfrentar para conseguir chegar aí) isso só revela a grande garra que lhe é reconhecido e depois também pôde contar com a fedelidade sempre amiga do João numa demonstração de grande amizade e solidariedade, pelo menos enquanto teve pernas para o acompanhar.
As maratonas nunca são iguais mesmo que o percurso seja o mesmo, as preocupações sobre os abastecimentos ás vezes traiem o nosso bom censo, mas isso é um problema que só se resolve com a experiência adquirida, a próxima edição já contará com um Paiva mais conhecedor e maduro para dar a volta ás necessidades básicas que o nosso organismo exige numa competição com esta dimensão.
Por tudo isto e também pelos incentivos que recebi da vossa parte os meus sinceros parabéns com vótos de uma boa e excelente recuperação.
Um abraço.

João Paixão said...

Muitos parabéns, grande prova!

NS said...

O tempo sub 3h30 pode não ter sido conseguido desta vez, mas certamente dois objectivos foram atingidos: terminar e recorde pessoal.

Desta experiência retiras certamente o ensinamento de que os abastecimentos terão também de ser treinados, sugiro que numa próxima preparação faças experiências nos treinos longos relativamente à ingestão de líquidos e sólidos para conheceres melhor o que o teu organismo tulera.

Parabéns e boa recuperação.

Otília Leal said...

Olá Miguel!

Parabéns pela tua excelente prova, foi um grande tempo final.
A quebra no final "quase" todos a sentiram, EU senti muito! Agora é esperar pela próxima porque a Moral ficou elevada, pode ser que seja melhor!

Agradeço todo o apoio,foi um grande prazer correr na "Invicta" desejo-te uma boa recuperação e até á próxima.

Otília leal

António Almeida said...

Olá Miguel
Depois de meses a tentares debelar a tua lesão imagino o quanto estás feliz por teres corrido de novo a maratona e pela prova que fizeste.
Foi um prazer voltar à Invicta repetindo a estreia de 2008, ter de novo como há um ano a tua companhia e do Mota, também de tantos amigos da blogosfera que também correram a maratona e as outras provas.
Para mim o tempo é de me consolidar como maratonista.
Boa recuperação.
Grande abraço.

Mark V said...

Olá Miguel,

Lembro-me de há mais ou menos 1 ano atrás ter descoberto um blog chamado "Maratonista". Não descansei enquanto não li todos os seus relatos e posso dizer que foram uma grande inspirição para mim como certamente o são para muita gente que aqui vai chegando via Google.

Mais de ano depois e após teres superado uma lesão completaste a tua segunda maratona com novo record pessoal. Não tenho dúvidas porém que o caminho natural seria que por esta altura estivesses a correr esta maratona muito abaixo deste tempo.
Tenho a certeza que esta nova época desportiva será bem sucedida para ti e que esse sucesso recomece já numa prova onde certamente farás questão de estar presente: a Volta a Paranhos.

Muitos parabéns e um forte abraço para ti e para o Meixedo que te acompanhou durante a prova(ainda estou à espera que o malandro coloque um post)

Mark Velhote

 
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