Thursday 12 August 2010

A maratona feminina dos europeus de atletismo


Bem sei que estas palavras aparecem um pouco fora de tempo, mas o que aconteceu às atletas portugueses que partriciparam na maratona do Campeonato da Europa de Atletismo merece alguns comentários, ainda que vindos de quem acompanha a realidade da alta competição à distância, sabendo pouco mais do que aquilo que é público.

No caso da maratona feminina, eu era daqueles que tinham fortes esperanças num resultado de grande nível da Marisa Barros e, lá no fundo da minha "adoração" pela Fernanda Ribeiro, esperava que ela pudesse, pelo menos, fechar a prova no top ten. A verdade é que me enganei redondamente.

Quanto à Fernanda, não vale a pena escrever muito, já que na fase da carreira em que ela se encontra o simples facto de ter estado em Barcelona já é por si só motivo de realce. Já quanto à Marisa Barros, a coisa é bem diferente.

Desde que se iniciou na maratona, Marisa fez, até Barcelona, um percurso permanentemente ascencional. "Abriu o livro" logo na sua primeira prova, com um tempo de grande categoria que lhe valeu a qualificação para os Jogos Olímpicos de Pequim. Aí, na condição de estreante, teve um comportamento que, não tendo sido brilhante, foi honroso, pelo que demonstrou de garra para chegar ao fim numa prova disputada em condições climatérias difíceis. Depois disso, Marisa continuou a gerir bem a carreira de maratonista, fazendo poucas provas, mas sempre com excelentes desempenhos e um record pessoal de nível mundial. Pelo meio, conseguiu ser a melhor europeia nos Campeonatos do Mundo de Berlin, com um excelente 6º lugar.

Sabendo-se que Marisa estaria em boa forma, era de esperar que conseguisse lutar pelas medalhas. O início de prova mostrava isso mesmo, com a nossa atleta sempre numa posição de destaque no grupo que liderou a corrida até aos 25 km. Em grande parte do tempo Marisa assumiu mesmo as despesas do andamento, aparecendo à cabeça do grupo. O que terá levado a que, com tamanha demonstração de autoridade ao longo da primeira metada da prova, Marisa tivesse falhado no momento em que a mesma se decidiu?

À imprensa Marisa falou de problemas relacionados com uma amigdalite que fora tratada umas semanas antes e do estômago. Ora, se Marisa sabia dessas suas fraquezas, porque razão se expôs (e desgastou) tanto na primeira metade da prova? Se ela tinha esses problemas, porque razão não optou por uma estratégia mais conservadora (com fez em Berlim, em que correu de trás para a frente)?

O oitavo lugar final é uma classificação honrosa para qualquer atleta. No entanto, para a Marisa que vimos evoluir desde 2007 sabe a desilusão. Espera-se, por isso mesmo, que ela e aqueles que a rodeiam saibam ter o espírito crítico suficiente para avaliar o desempenho da atleta, identificando e corrigindo os erros cometidos em Barcelona para que a possamos ver, já nos mundiais do próximo ano, e, principalmente, nos Jogos Olímpicos de Londres, a lutar pelo podium. Defendo que em desporto (e logo na maratona) ninguém pode garantir resultados, mas também não podemos chegar ao outro extremo, justificando os insucessos com meros dias de azar...

5 comments:

NS said...

Viva Miguel,

Tal como tu, também tinha fortes expectativas no resultado Marisa Barros, quer pelo resultado de uma prova de 15k que ela tinha feito recentemente (< 50') que indiciava estar numa muito boa forma, quer pelo facto de algumas das melhores europeias terem optado correr os 10000m (o caso da Abitova que roubou a prata à Jessica).

Não vi a prova. Vi os primeiros minutos e fui treinar, tendo deixado a gravar. Quando cheguei, soube o resultado e já não me apeteceu ver...

Uma nota a propósito do "correr na frente". Desconheço se é o caso da Marisa Barros, mas há atletas que sentem mais facilidade a correr se forem eles a puxar do que a seguirem o ritmo imposto por outros, são os chamados "front runners".

Era o meu caso, essa forma de correr tinha em mim um efeito auto-motivador. Julgo também que essa forma de correr torna-se natural naqueles atletas que conhecem as suas limitações em termos de velocidade e por isso adoptam uma estratégia de impor sempre o ritmo forte como forma de ir eliminando os adversários que em caso de prova lentas os poderão bater no sprint final.

Não tem muito a ver, mas quando vi a Marissa na frente ao princípio desejei que ela repetisse o feito da Joan Benoit em Los Angeles, um esticão logo a abrir e adeus!

Aguardemos, a Marissa ainda vai juntar o seu nome ao da Rosa e Manuela Machado.

MPaiva said...

Nuno,

No caso das mulheres há duas situações: as maratonas mistas e as maratonas "unisexo". Se nas primeiras elas não têm necessidade de assumir as despesas dos andamentos (há sempre um homem para isso), nas segundas podem ser obrigadas a tal.
Se formos analizar os resultados da Marisa, podemos chegar às seguintes conclusões:
- Maratonas mistas - Marisa conseguiu sempre excelentes resultados.
- Maratonas "unisexo" - O único resultado verdadeiramente bom foi conseguido em Berlim, em que a prova foi gerida "de trás para a frente".
A par desta reflexão, que a Marisa e a sua equipa de trabalho farão melhor do que nós, importa saber se haverá outros aspectos extra corrida poderão ter condicionado o seu rendimento.

abraço
MPaiva

MPaiva said...

Adenda:
A corrida da Joan Benoit em Los Angeles é outra coisa bem diferente. Era a primeira maratona feminina da história olímpica e não havia experiência sufuciente para perceber até que ponto aquele tipo de ataques deveria ser respondido ou não. Em todo o caso foi uma prova fabulosa da americana que teve para nós, o sabor a bronze pelas pernas da Rosa Mota!

NS said...

Miguel,

Duas notas adicionais:

1) O recorde pessoal da Marissa foi obtido este ano em Osaka numa maratona exclusivamente feminina. A Marisa teve sempre no grupo da frente, e foi uma daquelas provas tipicas, que à medida que os kms iam passando o grupo da frente ia ficando mais reduzido até que se deu o ataque da atleta que ganhou (julgo que uma etiope).

2) As maratonas mistas não são uma realidade nas principais maratonas. Por exemplo, Londres e Nova Iorque fazem partidas separadas para a elite feminina. Regra geral começam a prova meia hora mais cedo que a elite masculina, para evitar esse efeito de "ajuda" masculina.

Mas nada disto invalida a pertinência da tua questão, terá a Marisa utilizado a melhor estratégia para aquela prova?

abraço,

NS

MPaiva said...

Nuno,

Obrigado pela tua pertinente achega.
No fundo, aquilo que me parece é que a Marisa, não sei se pressionada pela condição de favorita, não sei se ressentindo-se dos problemas de saúde que referiu ou outros, acabou por seguir a estratégia errada para as circunstâncias daquele dia.
Curiosamente, o seleccionador nacional, José Barros, na análise que fez à participação portuguesa nos Europeus, referiu-se especificamente aos maratonistas como tendo sido daqueles de quem se esperaria mais e que era importante ser feita uma avaliação das razões que ditaram os resultados finais.

abraço
MPaiva

 
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